Fonte: IBRAM | Data:15/03/2021 (leia na íntegra)
O mercado financeiro vê com bons olhos o modelo de revisão regulatória e legal da indústria mineral brasileira, implantado e em curso pela Agência Nacional de Mineração (ANM), para reduzir a burocracia e promover maior transparência, equidade, previsibilidade e segurança jurídica para os investidores que se interessam pela atividade. Esse foi um dos temas abordados por especialistas no painel “Palestras de mineração Brasil-Canadá – Tendências jurídicas sobre financiamento de dívida e patrimônio líquido no Brasil, no último dia do Brasil PDAC_2021, em 11 de março.
Entre os resultados positivos, os investidores dizem já ter menores prazos para concessões de licenças. No caso do alvará de pesquisa, por exemplo, se a área de interesse estiver livre, o prazo de aprovação é de 34 dias. Somam-se a esse processo outras vantagens para os investidores. A oferta de áreas retidas, em leilões que vão ocorrer até o próximo ano, deve atrair até R$ 3 bilhões em aportes iniciais.
Na mesma linha, a possibilidade de usar os terrenos como garantia para financiamentos, uma reivindicação antiga dos investidores do setor, está em fase final de discussão pela ANM, como enfatizou o superintendente de Regulação e Governança Regulatória da Agência, Yoshihiro Nemoto. “A meta da Agência é que o setor de mineração consiga acessar mecanismos de viabilização de projetos mais consolidados, para atrair e dinamizar investimentos e gerar riqueza para o país e para a sociedade”, adiantou.
Pacificação de entendimentos
A especialista nas áreas de mercado financeiro e de capitais, private equity e M&A do escritório de advocacia Cescon Barrieu, Ana Paula Calil, reafirmou os avanços de governança promovidos pela ANM. “Antes vivíamos um ambiente de ausência de positivação, um problema antigo do setor e hoje já conseguimos vislumbrar ganhos como previsibilidade de procedimentos e prazos e ainda pacificação de entendimentos, que são fundamentais para atrair investimentos”, pontuou.
O Cescon Barrieu Advogados é o primeiro escritório full service brasileiro a ter presença física no Canadá, com 20 anos de atuação no segmento industrial. Segundo o sócio-gestor, Joaquim Oliveira, há oportunidades no Canadá, e o estreitamento do relacionamento entre o setor mineral dos dois países – uma das propostas principais do PDAC – é fundamental para gerar ganhos. Para auxiliar os interessados, o escritório lançou o seu Brazil Mining Guide, publicação que traz o panorama do país para a atividade mineral com tendências, perspectivas e oportunidades.
Sócio do Cescon Barrieu, Marcelo Mendo explicou que não existe financiamento sem garantias. Para ele, com a nova resolução de garantias da ANM coloca o Brasil na linha de frente do setor e iguala o país a outros, que já usam esse tipo de mecanismo. Para ele, os contratos de royalties feitos diretamente na ANM também podem trazer capital de exploração para projetos em desenvolvimento. “Este é o momento de aprofundar o debate com a CVM para nivelar essas informações para dar ao investidor a condição para avaliar e precificar recursos e reservas”, avaliou.
O avanço regulatório da atividade mineral vai fomentar um ciclo de desenvolvimento do mercado interno de financiamento. No entanto, caso os projetos de mineração sejam considerados prioritários pelo governo federal, como já acontece com os segmentos de Energia e Infraestrutura, a emissão de debêntures incentivadas pode ser mais um avanço para o setor.
BNDES
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) também está criando mecanismos para dar suporte financeiro aos projetos de mineração. Entre as medidas adotadas está a expansão dos prazos para 20 anos, de modo a cobrir a vida útil do empreendimento. Segundo o gerente de Inteligência de Mercado da instituição, Pedro Paulo Diniz, o banco já liberou mais de R$ 25 bilhões em crédito e deu suporte para investimentos de R$ 90 bilhões no setor mineral. Sem contar com os R$ 150 mil para obras no entorno das plantas, para beneficiar as comunidades.
“Além das questões regulatórias, as instituições financeiras avaliam os riscos geológico, sócio-ambiental e de mercado bem como a localização da planta, tipo de mineral e a curva de custo, estágio de maturidade da companhia e capacidade de formação de caixa, mas é possível dividir os riscos entre duas ou mais instituições, como foi feito em Maracás, em que três bancos nacionais concederam a garantia e o BNDES concedeu financiamento dentro do prazo solicitado”, destacou.
Abertura de capital exige profissionalismo e gestão sustentável do setor mineral
O interesse dos investidores estrangeiros no Brasil é fato que pode ser comprovado pelo número recorde de operações de IPO de empresas nacionais, fruto de uma percepção positiva do mercado e de uma maior compreensão das peculiaridades da indústria mineral, como ressaltou a sócia da Hogan Lovells, Izabel Carvalho.
“O investidor entende que são projetos de longo prazo, que demandam tempo. O prazo para financiamento também vai ser mais longo e com critérios mais duros. Entretanto, antes de se pensar em projeto, é preciso ter o estudo de viabilidade do projeto mineral, para quel ele seja bancável por bancos estrangeiros”, informou. Nessa negociação também podem entrar o pgamento de valor antecipado para adquirir uma parcela do negócio ou a negociação de royalties, que tem como base a produção ou lucratividade da planta.
Segundo o sócio do Cescon Barrieu Advogados, Maurício Pellegrino, a inclusão desses mecanismos, na resolução de Recursos e Garantias da ANM seria um passo a mais para a decisão dos investidores internacionais. “Hoje avaliamos três pontos que são as particularidades de cada país, requisitos e padronização para constituição de garantias e, ainda, a previsibilidade, o que não é fácil nem no Brasil e nem nos outros países”, justificou.
Gestão
Outro aspecto que também pode fazer a diferença é a preocupação do investidor com o ESG das empresas. Muitos bancos têm reagido a isso, com relação a riscos ambientais e práticas de corrupção, por exemplo. Nessa intermediação do crédito, as instituições financeiras querem resultados práticos como compliance e governança efetivos e geralmente não se contentam com informações escritas no relatório de viabilidade.
Um case de sucesso é o da canadense Sigma Lithium Resources, que acabou de concluir uma operação na bolsa de valores que resultou em US$ 20 milhões. Segundo a vice-presidente e chefe de estratégia da Sigma Lithium Resorces, Ana Cabral Gardner, a empresa foi construída em torno do ESG e que está há três anos no mercado de capitais com uma política que inclui materiais de qualidade superior, equipes qualificadas e concentradas na estratégia de negócios da empresa e entregas consistentes ao longo dos três últimos anos. “O sucesso se deve ao que a empresa tem feito de maneira diligente, durante sua trajetória de capital aberto desde 2018, porque temos desempenho acima do esperado, somado a um momento favorável do mercado”, destacou.
Para a sócia do Cescon Barrieu, Marina Prado, a percepção dos investidores sobre as práticas de ESG da Sigma foi o fator que acrescentou valor à transação realizada. “Tivemos a oportunidade de ter um capital de investimentos bem alinhado com as práticas e isso se traduziu em uma transação de maior porte e preços mais elevados porque a gestão do capital é parte da filosofia da empresa”, reafirmou.
O CEO da Ore Investiments, Mauro Barros, enfatizou que esse case de sucesso que foi usado pela Sigma pode ser replicado para as empresas brasileiras do setor mineral. “Decidimos nos unir às mineradoras que procuram o mercado financeiro. O potencial existe e temos que estar no radar de mercados financeiros e do interesse de empresas estrangeiras. Fizemos em Toronto, Sidney e esperamos em São Paulo, com investimentos focados em mineração”, apontou.
Mudança de cultura
As mudanças estruturais do Brasil também são um ponto importante que as empresas devem considerar para ingressar no mercado de capitais. Segundo Daniel Renner, da XP Investimentos, a empresa já “pavimentou” o caminho do setor por meio da transferência de conhecimentos sobre o setor. “Este momento pode ser uma oportunidade para todos os tipos de empresas de mineração nacionais. Temos potencial enorme em termos de mineração e há players alocados no país que já considera alternativas de aumentar capital por meio de abertura de capitais. Acredito que teremos um grande número de empresas participando desse processo”, projetou.
As multinacionais e transnacionais do setor mineral já têm a experiência do mercado de ações. No entanto, segundo o sócio da MacCarthy Tetrault, Gary Litwack, a flexibilidade do mercado de capitais auxilia as pequenas a se adaptarem a esse novo modelo de negócios. Para ele, o mais importante é ter os melhores conselheiros financeiros e stakeholders para fazer a análise do que funciona melhor para captar recursos. Nesse sentido, as fusões com empresas já listadas são uma boa estratégia. Nessa parceria, uma empresa levanta os fundos e a mineradora tem a operação como garantia para o negócio. “O mercado canadense possibilita esse tipo de operação, mas é preciso seguir os critérios”, adiantou.
O representante do Cescon Barrieu em Toronto, Frederico Marques, disse que o trabalho de vanguarda que a ANM tem feito no Brasil tem chamado a atenção de investidores canadenses em investir nas empresas listadas, o que pode somar esforços para o desenvolvimento sustentável do setor.
Sobre – O evento “Brazilian Mining Sessions 2021” é uma série de palestras realizadas online, de 5 a 11 de março de 2021, que ocorreram paralelo à convenção anual Prospectors nd Developers Association of Canada (PDAC 2021). As palestras são voltadas para investidores e profissionais interessados no setor mineral brasileiro e e fazem parte da iniciativa BRASIL PDAC 2021, coordenada pela Agência para o Desenvolvimento e Inovação do Setor Mineral Brasileiro (ADIMB) e pela Câmara de Comércio Brasil-Canadá (BCCC) sediada em Toronto, em parceria com Ministério de Minas e Energia e entidades do setor. O IBRAM e suas associadas integraram a comitiva brasileira no PDAC 2021.